Remanescente dos cordões carnavalescos estica a animação o ano todo

Quem não chora, não mama / segura, meu bem, a chupeta / lugar quente é na cama / ou então no Bola Preta, exultava em 1935 a marchinha-hino composta por Nelson Barbosa e Vicente Paiva. E o bloco é quente mesmo, até hoje, quando acaba de completar 101 anos de uma gloriosa folha corrida no carnaval carioca. Sambista da mais alta patente, João Nogueira também comungava da animação do Cordão do Bola, que celebrou o centenário em 2018 justamente no Imperator, centro cultural em homenagem ao compositor de “Poder da criação”.

O Bola Preta representa o último remanescente dos cordões carnavalescos que existiam no Rio em princípios do século XX, substituídos posteriormente pelos ranchos e escolas de samba. Jacob do Bandolim chegou a escrever e gravar, em 1954, um choro reverenciando o bloco, que foi um bravo ponto de resistência ao longo do tempo em que a folia de rua andou em baixa na cidade. Conservou a chama da festa pagã sempre acesa. Nem ao sofrer um duro revés em 2008, ao ter que desocupar judicialmente a tradicional sede da Avenida 13 de Maio, cenário de bailes concorridíssimos ao som de grandes orquestras, deixou de desfilar. A seu reboque, originaram-se muitos blocos que foram superando nos últimos anos a síndrome de esvaziamento e hoje arregimentam multidões nas ruas.

No sábado momesco, pela manhã, um cortejo de foliões – que já atingiu 2,5 milhões de pessoas –, em geral com fantasias em preto e branco, sai da Cinelândia, junto ao Teatro Municipal, ao som de quem não chora, não mama. Invade a Avenida Rio Branco, entre o Obelisco e a Candelária, serpeia pelas ruas do Centro e, no início da tarde, ganha a Praça Tiradentes. A pulação se encerra ao entoar da infalível “Cidade Maravilhosa”, de André Filho.

A agremiação, Patrimônio Imaterial do Rio, recebeu até o Rei Roberto Carlos, em pleno auge da Jovem Guarda, num espetáculo que entrou para os anais da casa. Atualmente, tem como padrinhos os cantores Neguinho da Beija-Flor e Maria Rita. Ao longo do ano, mantém em sua sede, na Rua da Relação – com restaurante e bar decorado por fotos que remontam a história do bloco –, uma agenda de eventos movimentada. São bailes, festas, pagodes, forrós, arraiais e feijoadas animados pela Banda Show (também chamada de Sinfônica do Carnaval), composta por cerca de 30 músicos.

No passado, o som de alta qualidade dos salões era prestigiado por políticos – como o presidente Getúlio Vargas e Negrão de Lima, governador do Estado da Guanabara – e artistas do porte de Pixinguinha, Dalva de Oliveira, Jamelão, Emilinha Borba, Ataulfo Alves, Elizete Cardoso, Alcione, Clara Nunes e Beth Carvalho. Além, claro, do inesquecível João – nó na madeira feito o Bola.

 

Bola Preta
Rua da Relação, 3 – Centro
Tel.: (21) 2240-8049