O berço etílico da mais bela coleção de canções da história da MPB

Verão de 1956. O Centro da capital federal abriga o Itamaraty, a Academia Brasileira de Letras, o Ministério da Educação, redações de jornais, rádios e gravadoras. As mesas da Casa Villarino, fundada por espanhóis três anos antes, estão lotadas de artistas e intelectuais que nos fins de tarde começam a dar expediente no escritório etílico da Rua Calógeras.

Tudo indica que será mais uma noite comum de conversas animadas, em torno de um bom scotch. Só que não, pois os astros estão configurados de forma a propiciar a gênese de um nascimento singular. Somente uma conspiração celestial para explicar o encontro de dois gênios – ou gêmeos em simbiose criativa – no mesmo espaço e tempo. Um fenômeno que impactará o Brasil de maneira espetacular.

Para tanto, os desígnios do firmamento se valem da interseção terrena do jornalista e crítico musical Lúcio Rangel, que apresenta o respeitado diplomata Vinicius de Moraes a um arranjador iniciante – um tal de Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim. O poeta busca alguém que musique seus versos para a montagem da peça “Orfeu da Conceição”. Tom, que corre atrás de algum para pagar o aluguel, aceita a proposta.

Mas o “sim” vem acompanhado de uma pergunta que deixa os presentes incrédulos, ante a oportunidade aberta pelo conceituado Vinicius ao jovem pianista: “Tem um dinheirinho nisso?” O fato é que “Orfeu”, protagonizado por Haroldo Costa, estreia em setembro no Teatro Municipal. E a trilha sonora, iniciada com nada menos que “Se todos fossem iguais a você”, inaugura a colossal parceria entre os dois gigantes da MPB.

A Casa Villarino – decorada com fotos de Vinicius e Tom, à frente das quais os turistas, sobretudo japoneses, tiram selfies de recordação – honra até hoje as tradições. Misto de uisqueria, restaurante e delicatessen¸ preserva à entrada um armazém de secos e molhados. Para abrir os trabalhos na happy hour, iscas de frango, espetinhos de salsichão com farofa e camarão empanado, ou sanduíches de salaminho, presunto cru serrano e queijo bola.

No quesito resistência, os clássicos bacalhau à Gomes de Sá, bife à cavalo ou à milanesa, arroz de lula e espaguete ao alho e óleo convivem em harmonia com os “novatos” filé mignon ao gorgonzola, frango à Cordon Bleu e filé de peixe com tapenade de azeitonas e purê de baroa. Tudo isso, claro, escoltado por cervejas tradicionais e artesanais, destilados e vinhos nacionais e importados. Já na categoria doces – que Vinicius adorava, em especial os papos de anjo, interditados pela diabete –, permanecem a goiabada cascão com queijo, o figo caramelado com catupiry e o pudim de leite da vovó.

Na saída, leve o filé de truta defumada, o atum equatoriano em conserva ou a pasta de sardinha da delicatessen. São acepipes perfeitos para degustar em casa, ao som de “Eu sei que vou te amar” ou “Chega de Saudade” – saudade que, em se tratando do poeta, não cessa nunca.

 

Casa Villarino
Avenida Calógeras, 6 – Centro
Tel.: (21) 2240-1627