Confeitaria no Centro é o estabelecimento gastronômico mais antigo do Rio
Foi um bota-abaixo ciclópico na Corte Imperial. Francisco Pereira Passos – nascido em 1836 em São João do Príncipe, na então província do Rio de Janeiro – havia estudado na École de Ponts et Chaussées (a mais antiga escola de engenharia civil do mundo), na França. Lá, acompanhou a grandiosa reestruturação urbana de Paris, envolvendo a execução de extensas e largas avenidas, comandada por Georges-Eugène Haussmann, prefeito do antigo departamento do Sena.
De volta ao Brasil, Pereira Passos virou alto funcionário do Império. Em 1902, ao tornar-se ele mesmo prefeito do então Distrito Federal, nomeado pelo presidente Rodrigues Alves, o modelo de reordenamento público que se impunha pelo acelerado adensamento da região central não poderia ser outro. Sob a inspiração das intervenções observadas na Cidade-Luz, a ambiciosa reforma envolveu a abertura de amplas avenidas – a começar pelas atuais Rio Branco e Beira-Mar – e a construção de parques e praças.
A necessidade de saneamento das insalubres condições sanitárias da Corte, marcadas por graves epidemias infecciosas, justificaram a polêmica demolição de morros e cortiços. Ao importar as modernas linhas europeias, Passos almejava imprimir no Rio um desenho mais cosmopolita. O monumento emblemático da influência parisiense é o Teatro Municipal, inspirado na Ópera de Paris.
Mas, antes disso, os modos gauleses já grassavam no Centro. O prefeito da capital do país era habitué, por exemplo, da Casa Cavé, fundada pelo francês Charles Auguste Cavé em 1860. Não havia quem cruzasse a esquina das ruas Sete de Setembro e Uruguaiana e não se deslumbrasse com a bela arquitetura da confeitaria. E também com as obras de arte dos sorvetes em taças magistralmente enfeitadas. Seu salão foi frequentado por intelectuais e políticos da estatura de Rui Barbosa, Olavo Bilac, Deodoro da Fonseca, Barão do Rio Branco, Mário de Andrade, Tarsila do Amaral, Chiquinha Gonzaga, Carlos Drummond e Juscelino Kubitschek.
Hoje, o mais antigo estabelecimento gastronômico da cidade permanece um templo de delícias que resiste heroicamente. Ali, o tempo parece em eterna suspensão, em meio a lustres e vitrais franceses em estilo art nouveau e mobiliário com as iniciais da casa. Para acompanhar o café ou chá, difícil mesmo é escolher entre 40 tipos de doces, desde mil folhas, éclair, strudel e papo de anjo a alunete (folhado com doce de leite, suspiro e castanhas), ducheese (massa de bomba, chantilly e fios d’ovos) e guardanapos (massa de pão de ló com coco e amêndoas). Os sorvetes continuam em alta, como o chinês (creme, chantilly e pó de amendoim).
Entre os salgados, vol-au-vent e pastel feito na pedra. Se o apetite exigir mais, prove o sanduíche típico português de filé de pernil suíno, desossado e marinado em vinho tinto e ervas finas, queijo e abacaxi. E não esqueça de levar para casa biscoitinhos e petit fours embalados em caixinhas de papel confeccionadas artesanalmente. Mimos de um Rio très élégant.
Casa Cavé
Rua Sete de Setembro, 133 – Centro
Tel.: (21) 2224-2520